Curiosamente, os grandes cenários do destino do Universo — Big Freeze, Big Rip, Big Crunch — longe de refutarem o eterno retorno, só fazem sentido se considerados dentro de um horizonte de repetição.
1. Se o Universo acabar no Big Freeze (a morte térmica)
Esse é o cenário mais aceito pela cosmologia atual: o Universo se expande para sempre até tornar-se frio, escuro e morto. Acontece em 10¹⁰⁰ anos, mas “acabar” não resolve nada.
Se o tempo continua, o Universo morto permanece sendo um estado estático eterno. E aí surge o paradoxo:
Por que estamos na fase viva e não na fase morta, que é infinitamente mais longa?
A resposta lógica é simples:
Se existe um ciclo, esta fase viva não é única. Já aconteceu e acontecerá de novo, infinitas vezes. O Big Freeze não é o fim — é apenas um intervalo entre repetições. A morte térmica não é a conclusão do tempo, mas o retorno à possibilidade de reinício.
2. Se houver um Big Rip (o universo se rasga)
No Big Rip, a energia escura cresce até desfazer galáxias, átomos, o espaço-tempo. Mas destruir o espaço-tempo não é o mesmo que destruir o tempo em si. O tempo pode permanecer como um campo vazio, sem eventos — até que um novo Big Bang surja numa região “liberada”.
O Big Rip, então, não seria o fim, mas apenas uma limpeza cósmica, devolvendo o Universo ao ponto inicial.
Se isso já aconteceu antes — e nada impede que tenha — então já existimos em outros ciclos rasgados, em outras versões de realidade, reemergindo do vácuo depois do colapso do contínuo.
3. Se houver um Big Crunch (o colapso total)
Aqui o eterno retorno se torna quase inevitável.
No Big Crunch, tudo volta para um único ponto — praticamente um novo Big Bang preparando-se para acontecer. É literalmente um ciclo físico, uma cosmogonia circular. A física séria já considera isso uma possibilidade matemática sólida.
Se o Universo colapsa de volta ao mesmo estado inicial de energia e densidade, não há razão para que uma nova expansão não reproduza — com variações mínimas ou exatas — o mesmo conjunto de eventos.
Somos, então, parte de um cosmo pulsante, que exala e inspira eternamente.
Nietzsche ficaria satisfeito: aqui o eterno retorno não é filosofia, é mecânica.
E o que havia antes do Universo? E o que haverá depois?
A cosmologia não consegue escapar dessa pergunta:
se houve Big Bang, houve antes.
E se haverá um fim, haverá depois.
Mesmo que não exista matéria, energia ou espaço, o tempo — enquanto possibilidade de mudança — precisa existir para que a transição entre estados seja possível. Sem tempo, não haveria “antes”, não haveria “depois”, não haveria Big Bang.
Assim, o tempo não nasce com o Universo: o Universo é que é um episódio dentro do tempo.
E se o tempo é maior que o Universo, então todos os instantes possíveis — inclusive este que você vive agora — tornam-se estatisticamente insignificantes. Para que “agora” exista, ele precisa ser um instante recorrente num ciclo temporal infinito.
Conclusão: O eterno retorno é a resposta natural
A tese do eterno retorno não é misticismo, não é religião, não é otimismo ingênuo. É uma solução racional para três problemas profundos:
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A improbabilidade absurda do agora.
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A existência de tempo antes e depois do cosmos.
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Os cenários físicos reais do fim do Universo.
Se o Universo fosse único, se houvesse apenas uma chance, se o agora fosse um ponto aleatório num oceano infinito de tempo… simplesmente não estaríamos aqui.
Ou o cosmos retorna eternamente, ou aceitamos que estamos vivendo um instante cuja probabilidade matemática é indistinguível de zero.
Nietzsche não acreditava no eterno retorno por superstição.
Ele acreditava por lucidez.
E, olhando para a cosmologia moderna, talvez ele estivesse alguns séculos à frente.