A ideia do eterno retorno sempre pareceu filosofia pura: o universo repetindo a si mesmo, infinitamente, até que cada detalhe da realidade volte a acontecer. Mas nos últimos anos, a física moderna — especialmente a teoria dos ciclos cósmicos de Roger Penrose — reacendeu essa discussão com força surpreendente.
E mais: quando analisamos com cuidado, o eterno retorno deixa de ser apenas metáfora. Ele se torna uma consequência matemática de um cosmos eterno.
Sim: se o universo dura para sempre, ele inevitavelmente se repete.
O Universo Cíclico de Penrose
Roger Penrose, um dos maiores físicos vivos, propôs a Cosmologia Cíclica Conforme (CCC). Nessa visão:
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o nosso universo não é o primeiro,
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nem será o último,
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mas apenas um “eon” dentro de uma sequência infinita de outros universos.
Cada eon começa com um Big Bang, evolui, expande-se e termina num estado tão rarefeito — apenas fótons, nenhuma massa — que o próprio tempo deixa de fazer sentido. Nesse ponto final, por uma transformação matemática elegante, o universo é conectado ao Big Bang do próximo eon.
É como se o fim de um universo fosse a porta de entrada para outro.
E isso se repete para sempre.
Infinitos ciclos + estados finitos = repetição obrigatória
Aqui entra o ponto mais interessante — e raramente discutido:
Se existem infinitos ciclos, e o número de estados possíveis do universo é finito, então o universo é matematicamente obrigado a se repetir.
Essa ideia deriva da chamada Recorrência de Poincaré, um resultado profundo da teoria dos sistemas dinâmicos. Em termos simples:
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Num sistema infinito em duração,
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mas com possibilidades limitadas,
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certos estados retornam novamente.
Mais cedo ou mais tarde, tudo volta.
Não é filosofia: é uma consequência estatística inevitável.
Assim, mesmo que os primeiros ciclos sejam todos diferentes, eventualmente — daqui a trilhões de trilhões de eons — surge um eon idêntico ao nosso, átomo por átomo.
Sim: nós, conversando agora, já “acontecemos” e “aconteceremos” de novo em um eon remoto.
Contrariando Einstein: o tempo não é absoluto
Einstein via o tempo como algo inseparável do espaço: ele nasce com o universo e morre com ele. Não existe “antes do Big Bang”.
Mas Penrose, ao mostrar que o fim de um eon pode se transformar matematicamente no início do próximo, aponta para uma estrutura maior onde:
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o tempo aparece e desaparece em cada ciclo,
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mas a totalidade dos eons existe numa espécie de panorama eterno.
É uma visão que ultrapassa a relatividade sem contradizê-la diretamente — apenas revela que a relatividade talvez descreva apenas um capítulo, não o livro inteiro.
E de onde surgiu essa ideia de o tempo nascer com o universo?
Historicamente, essa hipótese veio de três frentes científicas:
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Relatividade Geral: o tempo é parte da geometria do universo.
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Big Bang: as equações colapsam no início, sugerindo um “começo do tempo”.
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Termodinâmica: a flecha do tempo depende da entropia; sem processos irreversíveis, não há tempo.
Mas Penrose argumenta que isso é verdade somente dentro de um eon, não fora dele. No final do ciclo, quando tudo vira luz, a escala temporal perde sentido — e outra surge logo adiante.
Eterno retorno: metáfora ou inevitabilidade?
Unindo todos esses pontos, surge uma conclusão ousada:
Se os eons de Penrose são realmente infinitos, o eterno retorno deixa de ser mito e se torna consequência matemática:
o universo não apenas se recicla, ele eventualmente se repete.
Nietzsche imaginou isso como um desafio existencial.
Penrose, sem querer, ofereceu a estrutura física para torná-lo plausível.
A matemática completa o círculo dizendo: isso não só pode acontecer —
isso vai acontecer, se o cosmos for eterno.
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