quinta-feira, 27 de novembro de 2025

Penrose, o Eterno Retorno e a Lógica Matemática de um Universo que se Repete

 A ideia do eterno retorno sempre pareceu filosofia pura: o universo repetindo a si mesmo, infinitamente, até que cada detalhe da realidade volte a acontecer. Mas nos últimos anos, a física moderna — especialmente a teoria dos ciclos cósmicos de Roger Penrose — reacendeu essa discussão com força surpreendente.

E mais: quando analisamos com cuidado, o eterno retorno deixa de ser apenas metáfora. Ele se torna uma consequência matemática de um cosmos eterno.

Sim: se o universo dura para sempre, ele inevitavelmente se repete.


O Universo Cíclico de Penrose

Roger Penrose, um dos maiores físicos vivos, propôs a Cosmologia Cíclica Conforme (CCC). Nessa visão:

  • o nosso universo não é o primeiro,

  • nem será o último,

  • mas apenas um “eon” dentro de uma sequência infinita de outros universos.

Cada eon começa com um Big Bang, evolui, expande-se e termina num estado tão rarefeito — apenas fótons, nenhuma massa — que o próprio tempo deixa de fazer sentido. Nesse ponto final, por uma transformação matemática elegante, o universo é conectado ao Big Bang do próximo eon.

É como se o fim de um universo fosse a porta de entrada para outro.

E isso se repete para sempre.


Infinitos ciclos + estados finitos = repetição obrigatória

Aqui entra o ponto mais interessante — e raramente discutido:

Se existem infinitos ciclos, e o número de estados possíveis do universo é finito, então o universo é matematicamente obrigado a se repetir.

Essa ideia deriva da chamada Recorrência de Poincaré, um resultado profundo da teoria dos sistemas dinâmicos. Em termos simples:

  • Num sistema infinito em duração,

  • mas com possibilidades limitadas,

  • certos estados retornam novamente.

Mais cedo ou mais tarde, tudo volta.

Não é filosofia: é uma consequência estatística inevitável.

Assim, mesmo que os primeiros ciclos sejam todos diferentes, eventualmente — daqui a trilhões de trilhões de eons — surge um eon idêntico ao nosso, átomo por átomo.

Sim: nós, conversando agora, já “acontecemos” e “aconteceremos” de novo em um eon remoto.


Contrariando Einstein: o tempo não é absoluto

Einstein via o tempo como algo inseparável do espaço: ele nasce com o universo e morre com ele. Não existe “antes do Big Bang”.

Mas Penrose, ao mostrar que o fim de um eon pode se transformar matematicamente no início do próximo, aponta para uma estrutura maior onde:

  • o tempo aparece e desaparece em cada ciclo,

  • mas a totalidade dos eons existe numa espécie de panorama eterno.

É uma visão que ultrapassa a relatividade sem contradizê-la diretamente — apenas revela que a relatividade talvez descreva apenas um capítulo, não o livro inteiro.


E de onde surgiu essa ideia de o tempo nascer com o universo?

Historicamente, essa hipótese veio de três frentes científicas:

  1. Relatividade Geral: o tempo é parte da geometria do universo.

  2. Big Bang: as equações colapsam no início, sugerindo um “começo do tempo”.

  3. Termodinâmica: a flecha do tempo depende da entropia; sem processos irreversíveis, não há tempo.

Mas Penrose argumenta que isso é verdade somente dentro de um eon, não fora dele. No final do ciclo, quando tudo vira luz, a escala temporal perde sentido — e outra surge logo adiante.


Eterno retorno: metáfora ou inevitabilidade?

Unindo todos esses pontos, surge uma conclusão ousada:

Se os eons de Penrose são realmente infinitos, o eterno retorno deixa de ser mito e se torna consequência matemática:
o universo não apenas se recicla, ele eventualmente se repete.

Nietzsche imaginou isso como um desafio existencial.
Penrose, sem querer, ofereceu a estrutura física para torná-lo plausível.
A matemática completa o círculo dizendo: isso não só pode acontecer —
isso vai acontecer, se o cosmos for eterno.

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